quinta-feira, 5 de janeiro de 2017

O Presépio Tradicional Português

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A publicação que vos trago hoje, há muito prometida, é sobre o tradicional presépio português. Ao contrário dos presépios que normalmente se encontram, com as típicas figuras da natividade, de cariz canónico ou apócrifo, como Maria, José, Jesus, o boi e o jumento, os Reis e os pastores, estes recebem um grande número de personagens que engrandecem largamente a representação do nascimento de Jesus.
Estas personagens representam geralmente um ambiente tipicamente rural do norte português - sem esquecer que há diversas variações no presépio português consoante a região - mas estas peças são produzidas em oficinas de Barcelos, cidado do Distrito de Braga. Deste ambiente rural fazem parte as artes e ofícios populares, a paisagem povoada de serras, grutas, rios, fontes e lagos, todos os animais domésticos que, hierarquicamente colocados, reflectem bem a realidade cristã do natal português. Montado no início do Advento, ele vai durar até ao Dia de Reis, a 6 de Janeiro, quando é finalmente retirado. O que o torna único é a sua carga iconográfica e simbólica, presentes nas mais diversas personagens. Além dos tipicamente referidos, é possível encontrar a velha e única igreja da aldeia onde será realizada a Missa do Galo e a Missa de Natal, costume que não se podia perder. Lá fora a banda de música toca os seus instrumentos numa felicidade assinalada pelo nascimento do Menino Deus, enquanto um grupo de bailarinos folclóricos dança. O padre assiste ao acontecimento. Os ofícios vão salpicando a paisagem de acordo com a região pelo que é mais comum em zonas pesqueiras encontrar pescadores e varinas e nas áreas mais serranas ver os moleiros com os seus moinhos de vento e as azenhas. As mulheres fazem parte deste universo nas figuras das lavadeiras que coram a roupa branca junto ao rio, nas leiteiras que carregam as bilhas à cabeça,as vendedoras de ovos, mel, fruta e aves a quem quase é possível escutar o pregão. Nas padeiras que incansavelmente colocam e tiram pão do forno, um ofício cheio de saber que era parte do universo feminino. Mas os pastores lá longe na serra com as suas samarras para os proteger do agreste inverno português, também estão presentes acompanhados do seu fiel cão. No cimo do monte pode estar o castelo, a presença do senhorio da terra e do seu poder local. Não é possivel esquecer os agricultores, tão importantes para a economia de um país que muito viveu do trabalho do campo. Claramente há muitas outras personagens de ofícios e até edifícios mas estes são os mais comuns de encontrar.
O fabrico e uso destas peças vai gradualmente caindo em desuso pois sendo artesanal é cada vez mais difícil encontrar quem as queira produzir. Contudo, este ano, o presépio tradicional português é candidato a Património Imaterial da Humanidade.

A Visitação

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Chama-se Visitação ao programa iconográfico em que Maria, grávida, visita a sua prima mais velha, Isabel, também ela grávida de Joao Baptista, o Percursor. A fonte deste tema é uma passagem do Evangelho de Lucas: "Por aqueles dias, Maria pôs-se a caminho e dirigiu-se à pressa para a montanha, a uma cidade da Judeia. Entrou em casa de Zacarias e saudou Isabel. Quando Isabel ouviu a saudação de Maria, o menino saltou-lhe de alegria no seio e Isabel ficou cheia do Espírito Santo. Então, erguendo a voz, exclamou: «Bendita és tu entre as mulheres e bendito é o fruto do teu ventre. E donde me é dado que venha ter comigo a mãe do meu Senhor? Pois, logo que chegou aos meus ouvidos a tua saudação, o menino saltou de alegria no meu seio. Feliz de ti que acreditaste, porque se vai cumprir tudo o que te foi dito da parte do Senhor.» ( Lucas 1, 39-45). Quanto tempo permaneceu Maria junto de Isabel? As estimativas oscilam entre vários dias e vários meses. De acordo com uma tradição bizantina recolhidas das Homilias do monge Santiago, a Virgem teria permanecido até ao nascimento de João, assistindo inclusivé ao parto. São cinco os diferentes episódios em que o tema pode ser retratado.1: A Viagem, 2: o Encontro - onde a) as duas mulheres podem saudar-se à distância; b) podem abraçar-se de pé: c) Isabel ajoelha-se diante de Maria; d) a representação da gravidez com os dois embriões em transparência "in utero". Aqui podem também ser acrescentados personagens acessórios, como os maridos de ambas e as duas Marias, irmãs da Virgem. 3: Maria canta o Magnificat; 4:A Virgem assiste ao nascimento do Baptista e 5: O Regresso a Nazaré e a sua justificação (em relação à gravidez).
A Festa da Visitação que por lógica deveria ser antes da Festa da Anunciaçãio celebrada a 25 de Março, foi trasladada para o dia 2 de Junho. Esta representação com a evidência dos dois bebés que crescem nos ventres, foi proibida após o Concílio de Trento pelo que é um tipo iconográfico altamente medieval.


Escola Castelhana, A Visitiação da Virgem a Santa Isabel, c. 1451-1500, Museu Galdiano, Madrid.

Santa Eulália de Mérida...ou de Barcelona?

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Eulália de Mérida é uma santa que apresenta alguma controvérsia, por também se celebrar uma outra com o mesmo nome mas em Barcelona. Ambas espanholas, virgens e mártires sendo a de Mérida celebrada a 10 de Dezembro e a de Barcelona a 12 de Fevereiro. Assim, parece-nos estarmos perante uma duplicação de personagem e não de duas santas distintas. A tradição espanhola pressupõe a existência das duas, mas a grande maioria da crítica nega directamente a historicidade da santa de Barcelona.
Para Eulália de Mérida encontramos um hino no Liber Peristephanon composto em sua honra por Prudêncio, poeta romano que viveu no século IV/IV. Esta é a fonte mais antiga antiga que se conhece que cita Santa Eulália de Mérida. No século VII, e dependente deste hino surge o "Fulget hic honor sepulcri Martyris Eulaliae", em honra de santa de Barcelona atribuido a Quiríco, bispo de Barcelona. Deste mesmo periodo são as duas "Passio" cujas enormes semalhanças foram obviamente inspiradas de uma única fonte. Além do mais não é possível provar-se o a culto uma santa em Barcelona anterior à data da "inventio" das relíquias no ano de 877. É possível depreender que foi o trasladar de uma relíquia da santa emeritense para Barcelona que originou um culto local a uma santa homónima em Barcelona.
Na sua lenda Eulália tinha apenas doze anos quando colheu a palma do martírio. Filha de um senador e cristã, ao tomar conhecimento da proibição Calpurniano dos cristãos manterem o seu culto, pos-se a caminho para o interpelar. Após uma troca de injúrias e acusações a menina foi submetida a uma série de martírios: foi açoitada, as suas carnes desgarradas com ganchos de ferro, torturada no cavalo ( cruz em aspa), o seu tronco e seios foram queimados com brasas ardentes até que finalmente lhe prepararam uma fogueira para que fosse queimada viva.Quando finalmente expirou a sua alma saiu da boca em forma de pomba voando até ao céu. Nesse momento, caiu um forte nevão que protegeu o corpo da santa que foi recolhido no dia seguinte e sepultado no local do martírio.


Bernat Martorell, Martírio de Santa Eulália, cerca de 1442-1445, MNAC - Museu Nacional da Arte da Catalunha, Barcelona.

São Nicolau, aquele que traz os presentes

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Nicolau nasceu na segunda metade do século III em Patana, Lícia, (actual Turquia). Como leigo foi uma pessoa altamente estimada tanto pelo povo como pelo clero e rapidamente foi eleito bispo de Myra, uma pequena cidade costeira em Lícia. Nicolau guiando a sua diocese com grande caridade, dedicação e severa ortodoxia. Ao que parece foi apresentado ao Concílio de Niceia em 325 A.D. e condenou a heresia do arianismo. São Nicolau morreu uns anos mais tarde, a 6 de Dezembro. No início do século VI uma série de lendas foram acrescentadas à sua história por for forma a enriquecê-la. Estas, por sua vez, moldaram imagem e as suas características na arte, onde narrativas da sua vida, não raras vezes, retratam a sua infância e a sua caridade. Uma das mais famosas foi a sua atitude que o levou a oferecer dinheiro para o dote de três irmãs pobre de forma a salvá-las de uma vida de prostituição cujo pai desesperado e na pobreza se encontrava na iminência de as vender. Outras histórias incluem a sua intervenção e milagres após a sua morte. Foi um santo largamente venerado no Norte da Europa, influenciando a criação do actual Pai Natal.
Normalmente está vestido como bispo e usa uma mitra mas também pode aparecer sem qualquer adereço na cabeça. Tipicamente segura um báculo e um livro. 
Atributos: três esferas de ouro, três crianças numa selha, pão, âncora e barco. 
Padroado e proteções: É invocado pelos navegantes, peregrinos, perfumistas, pobres, estudantes e crianças. Uma vez que é protector das crianças tornou-se naquele que lhe traz os presentes no dia da sua festividade. 
Esta foi uma forma de cristianizar os festivais pagãos dedicados ao solstício de Inverno.

Já cheira a Natal... :D

Girolamo Macchietti, A carida de São Nicolau, cerca de 1555-60, Galeria Nacional, Londres.

A Apresentação de Maria no Templo

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O templo apresenta quinze degraus, tal como os Salmos do Antigos Testamento, conhecidos como Graduais, que os peregrinos recitavam enquanto subiam. No topo, a figura do Sumo-Sacerdote recebe Maria, surpreso e orgulho pela confiança da pequena criança. Maria tinha apenas três anos quando Ana e Joaquim, seus pais, a entregaram no templo,mas como nos relata o Evangelho de Pseudo-Mateus (Apócrifo), a sua maturidade e determinação ao caminhar fizeram-na assemelhar a um adulto. Talvez por este motivo a arte representa Maria como uma menina mais velha. A pré-figuração contida na ffirmeza de Maria em não olhar para trás, vemo-la na figura antitética da esposa de Lot, que não resistiu à tentação de olhar para trás e terminou transformada numa estátua de sal. Contudo, não existem referência bíblicas ou não bíblicas da tradição das primogénitas (mulheres) serem apresentadas no templo. Também não há qualquer referência acerca da permanência de crianças, rapazes ou raparigas, que habitassem no templo. Provavelmente a ideia de que Maria foi entregue no templo surgiu para explicar e justifcar a sua perpétua virgindade e santidade.


Mestre da Vida da Virgem (alemão - colónia), Apresentação de Maria no Templo, século XV, Alte Pinakothek, Munique.

Jael como pré-figuração de Maria

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Quando Débora era juíza em Israel, decidiu mandar as tribos hebraicas em batalha conta os nativos Cananitas liderados pelo general Sísera. Jael, membro da tribo dos Queneus, inimigo histórico dos israelistas, quebrou as regras e decidiu lutar pelo hebreus. Quando Sísera, pensando que as duas tribos se haviam pacificado, aceitou o convite de Jael para se juntar a ela na sua tenda. Ela recebeu-o, ofereceu-lhe leite e convidou-o a descansar. Assim que ele caiu num sono profundo, Jael matou-o usando uma cavilha e um martelo, provavelmente feitos de madeira, similares aos que os Beduínos usavam para firmarem as suas tendas no solo. A transformação de Jael, de uma pacífica e hospitaleira anfitriã para uma resoluta, forte e corajosa mulher, faz dela a perfeira pré-figuração de Maria, a Libertadora, ela que firmemente esmaga a cabeça da serpente.
Também Débora canta um hino de louvor a Deus apó Jael chamar Barak, comandante das tropas israelitas para que visse o seu feito. Débora ressalta ainda que o povo de Meroz, subjugado pelo medo, não tomou o lado de Israel e como foi uma simples mulher que salvou o dia. Por essa razão, Débora chama-lhe "bendita entre todas as mulheres", a mesma saudação que Isabel dirigiu a Maria.


Artemisia Gentileschi, Jael e Sísera, cerca de 1620, Museus de Belas-Artes de Budapeste

Cristina de Bolsena - a santa dentro das santas.

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Santa Cristina, conhecida como Santa Cristina de Bolsena ou de Tiro, foi uma virgem e mártir que viveu no século III. Originalmente a santa foi venerada em dois lugares muitos distantes um do outro: Bolsena, em Itália e Tiro actual Líbano. Pensou-se que poderia tratar-se de duas santas distintas que partilhavam o mesmo nome e que viveram no mesmo período (altamente improvável). É também incerto se seria uma santa italiana vinda originalmente do Oriente, ou uma santa oriental venerada muito cedo em Itália. Sabe-se que terá sido martirizada durando o reinado do imperador Diocleciano nos inícios do século IV. A sua lenda surgiu muito tardiamente em relação ao seu martírio, aparecendo baseado nuns escritos do século IX e que sofreu algumas variações. Conta que uma jovem mulher, filha de um comerciante sofreu uma série de terríveis martírios por recusar prestar homenagem aos deuses de Roma. Até aqui nada de novo. Contudo, os eventos da sua vida e martírio parecem ainda reciclar temas de outras virgens mártires como: Santa Bárbara - Cristina seria igualmente bela como Bárbara e por isso o pai aprisionou-a numa torre -, ou Ágata - por um dos seus martírios ter sido o arrancar dos seios - ou ainda Santa Úrsula - pois de acordo com a mesma tradição foi trespassada por uma flecha. Os seus atributos são variados devido aos numerosos martírios: flechas, a roda que também lhe teria sido atada ao pescoço e atirada a um rio, também muito típica, a roda a que foi atada e que se partiu como Santa Catarina. No entanto, o seu atributo mais particular sao as serpentes, que deveriam picá-la e matá-la mas voltaram-se contra o seu algoz.
É portanto muito provável que Santa Cristina tenha nascido da piedade popular e a sua lenda tratada como histórica.
De forma muito curiosa, a sua mais antiga representação data do século VI, onde está figurada na Procissão das Virgens Mártires, na Basílica de Santo Apolinário-o-Novo em Ravena.


Giovanni Francesco "Gianfrancesco", Santa Cristina´(fresco), 1508, Basílica de Santa Cristina, Bolsena.

Iria, a santa "portuguesa" que deu o nome a Santarém

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Hoje é dia, hoje é dia...hoje é dia de Santa Iria! E como santa "portuguesa" quero muito trazer a publicaçao sobre a mesma. (20 de Outubro).
Os santos mártires e altamente lendários são, sem sombra de dúvida os mais fascinantes. Iria não perde em nada os detalhes surreais da sua lenda.
Difícil de comprovar dada a antiguidade do relato, é contado que Iria (ou a variação Irene) nasceu e viveu no século século VII, cerca de ca. 635 - 653, durante a ocupaçao visigótica,na região de Nabância que corresponde actualmente à cidade do Tomar. Filha de pais abastados e influentes, estes terão desejado desde cedo que esta abraçasse vida religiosa dando-lhe para isso uma boa educação e fazendo-a ingressar num mosteiro de beneditinas regido pelo abade Sélio(ou Célio) seu tio materno. Como era muito bela (eu ja não li isto algures?) despertou o amor de um jovem de nome Britaldo. A santa recusou todas as suas propostas explicando-lhe que era uma virgem consagrada a Cristo e por isso o seu casamento nao era possível. Ao contrário do esperado, Britaldo caiu doente e Iria, movida por piedade cristã visitou-o e tentou consolá-lo. Este fez a jovem monja prometer que nunca amaria nenhum homem nem casaria, o que ela de imediato assentiu. Também Frei Remígio, ocupado da orientaçao espiritual da jovem se encantou da sua beleza e se apaixonou e, tal como ele, foi recusado. Cego de e raiva, fez com que Iria bebesse uma tisana, preparada com ervas que deveriam fazer o seu ventre aumentar dando assim a entender os sinais da gravidez. Como já ninguem acreditava na sua virtude foi expulsa do convento e refugiou-se junto ao rio Nabão. Britaldo, ao tomar conhecimento e porque acreditava que a santa havia quebrado a promessa mandou assassiná-la apunhalada no peito e lançada às águas. O seu corpo viajou e parou nas águas do Tejo onde permaneceu até ser descoberto por beneditos perto de Scalabis(actual Santarém). O seu culto foi difundido e até a cidade mudou o seu nome de Scalabis para Santa Iria(Irene) hoje Santarém.
Os seus atributos são escassos tem apenas o hábito beneditino e a palma do martírio e é celebrada a 20 de Outubro.
Esta lenda alicerçou-se sobretudo da tradução oral popular e também do maravilha obra literária de Almeida Garret "Viagens na minha Terra". Não existe qualquer fonte de autor antigo sobre a lenda.

"- Dizei-me pastores que guardais o gado,
Que ermida é aquela que além branquejava.
-É de Santa Iria bem-aventurada,
Que ao pé dum penedo morreu degolada.
- Oh minha Santa Iria, meu amor primeiro,
Perdoa-me a morte, serei teu romeiro!"
(Lenda de Santa Iria Cancioneiro Popular)


Santa Iria, Igreja de Santa Marial do Olival, Tomar, Portugal. Foto da autoria da administradora

Santos Inocentes: os Proto-mártires

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Ainda no seguimento do tema da Fuga e do Regresso do Egipto, trago-vos hoje outra representação ligada aos anteriores: os chamados Santos Inocentes. As crianças de Belém e das áreas circundantes que foram assassinadas por ordem de Herodes, o Grande, foram considerados mártires mesmo não tendo consciência daquilo que se estava a passar. O evangelho de Mateus 2:16 mantém-se como a fonte primária para este relato: Herodes soube pelos magos, que havia chamado à sua presença, que uma estrela brilhante apareceu no céu e que o rei dos judeus havia nascido, como ditava a profecia. A sua intenção, como fizera saber aos magos, não era de prestar homenagem mas sim eliminar o seu rival. Contudo, após visitarem Jesus um anjo apareceu aos Magos indicando-lhes que não voltassem a Jerusalém, o que eles cumpriram. Herodes, percebendo que havia sido enganado e que não teria assim acesso à localizaçao de Jesus, ordenou o Massacre dos Inocentes. Todas as crianças do sexo masculino dos dois anos para baixo seriam assassinadas esperando assim ter a garantia de que Jesus estivesse entre elas (aqui já seu havia iniciado a Fuga). As passagens bíblicas não oferecem nenhum espaço temporal desde o momento da Natividade ate à Epifania. Então porquê a selecção das crianças até aos dois anos de idade? Os apócrifos respondem e arte foi buscar essa informação; Fica subentendido que nos Canónicos os dois momentos são quase simultâneos. Os apócrifos da infância, nomeadamente o de Pseudo-Mateus, conta-nos que a visita dos Magos se dois anos após a Natividade. Dai o fundamento para os meninos até essa idade e não os recém-nascidos.
Considerados os proto-mártires, são representados com a palma. O papa Pio V instituiu uma festa em sua memória, celebrada a 28 de Dezembro na Igreja Ocidental e 29 do mesmo mês na Igreja do Oriente.


Matteo di Giovanni, Massacre dos Inocentes, 1482, Convento de Santo Agostinho, Siena

A atribulada infância de Jesus - parte II

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A seguidora Danielle Rocha aguarda ansiosamente por esta publicação, por essa razão, hoje saiu.
Já havia falado sobre o tema do Regresso da Fuga, agora voltando um pouco atrás trago a Fuga para o Egipto.
Dos quatro Evangelhos Canónicos, apenas são Mateus faz referência a esta passagem numas breves linhas: "Lavanta-te, toma o Menino e Sua mãe e foge para o Egipto; fica lá até que eu te avise, porque Herodes vai procurar o Menino para o matar(...). " (MT 2:13). Este aviso chegou a José sob a forma de um sonho onde um Anjo lhe dá ordens específicas sobre como dever proceder. Uma vez mais é a Legenda Aurea e os Evangelhos Apócrifos que recheiam estes episódios de forma mais rica e mais fantasiosa. Ora presumivelmente, esta Fuga deu-se depois da Epifania (ou Adoraçao dos Magos) quando estes não quiseram ceder a Herodes a localizaçao de Jesus. Novamente, os Apócrifos da Infância dizem-nos que quando se deu o momento da Epifania tinha Jesus dois anos - o que pode justificar a ordem da Matança dos Inocentes a todos os meninos dos dois anos para baixo. O tema da Fuga, por vezes confundido com o do Regresso, apresenta detalhes iconográficos importantes para marcar a diferença: a Fuga dá-se com Maria sentada no jumento e Jesus é ainda bebe sendo o Regresso o oposto Jesus é já uma criança e caminha a pé com os pais. Escolhi propositadamente esta representação porque ela apresenta cenas em continuidade, ou seja, é um acontecimento com micro acontecimentos. Na primeira perspectiva vemos a família que foge, mas mais ao fundo vemos outras representações, todas elas de tradição apócrifa que ficarão para uma próxima.


Mestre das Meias-Figuras Femininas (Holandês activo entre 1525-1550), A Fuga para o Egipto, c. 1530-35.

Santos Vicente, Sabina e Cristeta - três mártires irmãos

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Hoje trago-vos a maravilhosa representação de três santos, cujo martírio foi conjunto.

Vicente, Sabina e Cristeta seriam três irmãos. A tradição da sua lenda fixou-se em Ávila, local onde vieram a conhecer o martírio. Terão chegado a esta cidade por volta do século IV fugindo às perseguiçoes feitas aos cristãos. Ainda que de forma muito controversa são considerados de origem portuguesa, sendo que o que existe de documental refere-os como naturais de Ebura, que poderá ser Évora, mas também Ebura de Carpentania sendo este apontado como o local mais provável. Aparte a sua origem, Vicente foi preso e interrogado, seguindo o rito natural costumado. Foi conduzido ao templo e obrigado a incensar a estátua de Jupiter, que terá recusado. 
A sua lenda conta ainda que, ao entrar no templo o chao debaixo dos seus pés ficou macio como cera ficando impressos os seus pés e o báculo que usava para caminhar. Os sacerdotes, ao presenciarem isto e achando mau augurio mentiram ao pretor dizendo que Vicente havia pedido três dias de reflexão para decidir se rendia homenagem a jupiter ou não. Encarcerado de novo, foi visitado por suas irmãs, Sabina e Cristeta, que lhe suplicaram que fugisse com elas. O santo, ofendido, respondeu que fugir do martírio era covardia, mas deixou-se convencer quando as irmãs lhe disseram que ficariam sós e desamparadas no mundo. Com ajuda dos carcereiros, conseguiram chegar até Ávila onde os homens do pretor os capturaram e fizeram martirizar; foram despidos das suas vestes, arrastados pelos cabelos, colocados no cavalo de tortura para que os seus membros fossem destroçados, perecendo finalmente com os crânios esmagados sob uma laje. Podemos ver ainda na representação dois anjos que segurando um lençol juntos fazem a elevatio animae, a subida da alma dos mártires ao céu onde se pode ver a Dextra, a mão de Deus que parece abençoar o ocorrido.
Era o ano de 306.

Cenotáfio dos irmãos Mártires - detalhe do martírio, século XII, Basílica dos Santos Irmãos Mártires Vicente, Sabina e Cristeta, Ávila.

A Madonna e o Menino com uma colher

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Não é novidade que os Evangelhos Canónicos são quase completamente silenciosos no tema da infância de Jesus. Duas passagens no Evangelho de Lucas é tudo o que se pode encontrar. Esta falta de informações é preenchida pelos Evangelhos Apócrifos e pela Legenda Aurea. A piedade e curiosidade populares fizeram surgir na arte várias temas que não são de tradição bíblica e muitas vezes nem apócrifa. Muitos temas nasceram para provocar sentimentos e emoções no espectador, caso contrário grande parte das representações da virgem com o menino que se conhecem (entre outras) nem sequer existiam.
Esta belíssima representação mostra-nos Maria que alimenta Jesus com uma sopa, onde talvez o menino quisesse tentar comer sozinho por segurar firmemente na sua mão uma colher. Sobre a mesa há uma série de elementos que podem representar simples objectos do quotidiano, ou então conter misticamente uma referência mais profunda que o autor quis deixar bem claro.
O sacrifício de Cristo (representado pela faca) que oferece o seu corpo (o pão) como redenção pelo pecado original (a presença da maça), sendo o fruto oferecido pela serpente a Eva e cuja presença da larva indica a corrupção. Maria, sempre jovem, apresenta um delicado véu que na realidade não cobre os seus cabelos, usando-os soltos finos e longos, como símbolo da sua pureza. (É desta forma que comumente vemos as santas virgens serem representadas). Ao fundo junto da janela, um livro e uma cesta aludem ás tarefas de Maria de oração e trabalho de fiação. São também elas de tradição apócrifa que Maria tendo vivido no templo desde os três anos de idade junto com outras meninas, foi a escolhida entre todas para tecer a púrpura e o escarlate, os mais preciosos de todos os materiais.


Gérard David, A Madona e o Menino com uma colher, c. 1515, Real Museu de Belas Artes
 
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